A Defensoria Pública do Estado da Bahia instaurou nesta semana um Procedimento para Apuração de Dano Coletivo (Padac) com a finalidade de investigar a ação policial que terminou em 12 mortes no bairro de Fazenda Coutos 3, no Subúrbio de Salvador. O caso aconteceu em 4 de março deste ano – dia de Carnaval.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA), os doze mortos eram integrantes de uma facção criminosa. Contudo, a Defensoria considera imprescindível apurar os fatos, destacando dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que posicionou a Bahia, em 2022 e 2023, em primeiro lugar no número de mortos por policiais no país. A DPE também usa como base números divulgados pelo Instituto Fogo Cruzado.
“Considerando que, no dia 4 de março de 2025, na terça-feira de Carnaval deste ano, uma operação policial no bairro de Fazenda Coutos terminou com a morte de 12 (doze) homens jovens e adultos de 17 e 27 anos. Dados compilados pelo Fogo Cruzado mostram que é a 100ª chacina em Salvador e região metropolitana desde o início das pesquisas na Bahia, em julho de 2022. Desse total, 67% das chacinas envolveram policiais, resultando em 261 mortos”, diz trecho da Portaria nº 01/2025, publicada no Diário Oficial de quarta-feira (9).
Na publicação, a Defensoria também destaca casos emblemáticos de mortes envolvendo policiais militares. A morte de três jovens na comunidade Solar do Unhão, na Gamboa, que resultou na denúncia contra quatro PMs por fraude processual. “Alteraram, substancialmente, a cena do crime em diversos momentos, objetivando apagar os rastros dos homicídios”, apontou a investigação.
Também cita a Chacina do Cabula, em 2015, quando nove policiais militares mataram outros 12 (doze) jovens negros em circunstâncias que apontam para execução. “A polícia argumentou que as vítimas, com idade entre 15 e 28 anos, eram suspeitos de integrar uma quadrilha que planejava roubar um banco da região. Entretanto, uma investigação do Ministério Público sobre o caso concluiu que a ação dos agentes foi uma execução motivada por vingança. Isso porque, dez dias antes, um tenente fora atingido com um tiro no pé durante uma operação no bairro. Ao todo foram 143 tiros, 88 certeiros, a maioria deles em um ângulo que sugere que os jovens estavam rendidos e foram executados”, narra a portaria da Defensoria Pública.
No Artigo 16 do documento, a Defensoria Pública justifica que “detém legitimidade e adequada representação para funcionar na tutela coletiva discutida, sendo seu objetivo a promoção de direitos humanos e sua função institucional o manejo de medidas capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos aptos a beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes, no caso pessoas moradoras de
territórios vulneráveis que são afetadas pelo contexto de violência armada e operações policiais”.
Preservar provas na cena do crime
O grupo morto pelos policiais é apontado como responsável por invadir a Rua Teotônio Vilela, área dominada por rivais, durante a madrugada e ter promovido um intenso tiroteio. Após os doze homens serem atingidos, os PMs levaram os corpos para o Hospital do Subúrbio, onde as mortes foram constatadas. Um vídeo registrado por moradores da localidade mostra o estado da casa após o tiroteio [assista abaixo].
“Em tempo, o Protocolo de Minnesota, documento lançado em 24 de maio de 2017 pelas Nações Unidas, estabelece um conjunto de diretrizes de investigações de crimes cometidos pela intervenção de agentes do Estado, dentre elas a de que a investigação deve preservar a cadeia de prova, a cena do crime, identificar potenciais testemunhas, realizar perícia do corpo das vítimas a partir de leituras de diversas linhas de investigação. Entre outras diligências, o Protocolo estabelece que, em relação à cena do crime, os investigadores devem, como mínimo, fotografar esta cena, qualquer outra evidência física e o corpo como foi encontrado”, pontua a DPE.
Moradores filmam imóvel após ação policial
Dentre as medidas a serem adotadas para reduzir a letalidade policial na Bahia, a DPE determina como diligências iniciais:
- Expedição de ofícios para Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia; Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Estado da Bahia; Delegado-Geral de Polícia Civil da Bahia e Corregedor-Geral da Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia;
- Consulta às organizações da sociedade civil parceiras da DPE/BA sobre se familiares das vítimas buscaram o apoio das entidades;
- Agendamento de reunião com a Secretaria de Segurança Pública e a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos para tratar do problema e entender a quantidade de câmeras nas fardas (“bodycams”) que vêm sendo efetivamente utilizadas pelas polícias do Estado;
- Tratativas com a Secretaria de Segurança Pública e a Superintendência de Prevenção à Violência para a criação de um canal de comunicação para a denúncia do desaparecimento de pessoas após abordagem policial;
- Realização de audiência pública, organizada pelas Defensorias Públicas Especializadas de Proteção aos Direitos Humanos, Criminal e de Execução Penal e o Núcleo de Equidade Racial, para debater a situação emergencial da letalidade policial no Estado na Bahia, com a participação de instituições públicas e organizações da sociedade civil;
Conforme noticiado pelo Correio Suburbano em 2024 (veja aqui), as companhias independentes da PM na região do Subúrbio de Salvador não foram contempladas com os equipamentos na primeira etapa de implementação, assim com também na segunda.
O que diz a SSP sobre a ação em Fazenda Coutos
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) informou que, após relatos de uma invasão promovida por um grupo fortemente armado de uma organização criminosa na região de Fazenda Coutos, em Salvador, a Polícia Militar da Bahia intensificou o policiamento no bairro para conter a escalada da violência e garantir a segurança da população.
Durante incursões realizadas na área, houve resistência armada por parte dos criminosos, resultando em confronto. No desdobramento da ação, 12 suspeitos foram alvejados, socorridos para o Hospital do Subúrbio, mas não resistiram aos ferimentos.

Como parte da operação, um vasto arsenal foi apreendido, incluindo submetralhadoras, pistolas, revólveres, carregadores, munições, além de entorpecentes e balanças de precisão.
A SSP-BA destaca que todas as circunstâncias do confronto já estão sendo investigadas pela Polícia Civil, com a realização de perícias pela Polícia Técnica, em conformidade com os protocolos legais.